Cancelamento de grandes feiras gera impacto ao setor em 2021 e levanta dúvidas sobre continuidade do modelo

Início de 2022 é marcado por expectativa de retomada, em meio a novos adiamentos e exposições reduzidas em termos de público e área ocupada; na opinião de executivos, eventos online são importantes para atualização, mas não substituem as oportunidades de geração de novos negócios das edições presenciais

Por Gabriel Cortez,
Jornalista do conselho editorial do Top C-Level

Grandes eventos como a CES, a NAB, o ISE e o IBC costumam ser uma oportunidade de encontrar diversos clientes em um único local e, ao mesmo tempo, apresentar inovações, produtos e serviços para o mercado, gerando leads e novas possibilidades de negócios. 

Em 2021, contudo, os principais congressos e feiras mundiais da indústria de mídia e entretenimento tiveram as suas edições físicas canceladas, assim como já havia ocorrido em 2020. A equipe editorial da Revista Top C-Level conversou com executivos do setor para repercutir os impactos destes cancelamentos e projetar as tendências e expectativas para 2022.  

A CES, primeira grande feira do ano, realizada em Las Vegas, em janeiro, registrou 70% menos visitantes do que no período pré-pandemia e o ISE, que estava previsto para fevereiro, foi remarcado para maio, devido ao aumento nos casos de Covid-19 registrados com o avanço da variante Ômicron.

Luis F. Fabichak (Sony)

Luis Fernando Fabichak, Managing Director da Sony no Brasil, destaca: “As feiras são um importante driver para os projetos da companhia, pois permitem o hands on nos produtos, demonstrações por especialistas e, no caso dos principais key accounts, os encontros com os engenheiros do Japão. Muitas vezes, temos decisões tomadas durante o evento, ou logo após, em consequência do que foi visto e discutido durante a feira. É certo que tentamos compensar a ausência delas com seminários online, e aprendemos muito com isso, mas a experiência nos mostrou que a adesão não é a mesma e raramente temos a presença dos principais executivos das emissoras atendendo a esses seminários. Embora para alguns direcionamentos específicos, tornou-se bem útil e mais abrangente”, afirma.

O executivo lembra que a Sony tem realizado os seminários direcionados para as principais emissoras, como costumava fazer no pré e pós das grandes feiras. “É importante, mas não substitui o evento físico, as pessoas que estão reunidas ali naquele ambiente. É possível responder a quase qualquer dúvida do cliente, porque as pessoas-chave estão atendendo ao evento. Mas, sentimos que, com a ausência das feiras, são também adiadas algumas tomadas de decisões por conta dos clientes que aguardam as atualizações tecnológicas implementadas pelos fabricantes. É verdade que a pandemia causou uma crise econômica global. Isso também inviabilizou novos investimentos.” 

No caso do mercado brasileiro, Fabichak crê que já se vivia um momento mais delicado, o qual piorou com a pandemia e a taxa do dólar atingindo o seu maior patamar histórico. “Considero fundamental a retomada dos eventos para que possamos divulgar o que a Sony apresenta de novo para o mercado”, sinaliza.

Encontros virtuais não suprem demanda por novos negócios 

Jurandir Pitsch, vice-presidente de vendas para América Latina e Caribe da SES, afirma que a companhia já estava cautelosa em relação aos eventos presenciais em 2021 e prevendo participações bem modestas em feiras como a NAB e IBC. “O cancelamento não foi uma grande surpresa e não causou grandes transtornos aos nossos planos em 2021. Mas, de uma forma geral, estes eventos são importantes para a SES na geração de leads, negociações de fechamento com clientes e demonstrações ao vivo de novos serviços e sistemas. Assim, é realmente uma pena o cancelamento.” 

Jurandir Pitsch (SES)

Os eventos virtuais não têm mostrado a mesma eficiência na geração de negócios, na visão do executivo. “Eles têm um caráter mais informativo e ajudam a manter o contato com os clientes existentes, mas os eventos presenciais são muito importantes para fechamentos de negócios e geração de novas oportunidades. Estamos ansiosos para que tudo volte ao normal. Talvez as empresas ainda voltem de forma tímida, com estandes menores e uma presença de pessoas mais reduzida, mas será importante a retomada”, acrescenta.

“Eu, pessoalmente, acredito que mesmo que isto aconteça, os próximos eventos ainda serão menores em termos de presença e área ocupada com estandes, em função de impactos de longo prazo da pandemia (redução de custos, consolidação da indústria, maiores restrições à viagens, etc)”, conclui Pitsch.

Roberto Primo

Resultados financeiros não acompanham altas audiências

Roberto Primo, executivo de Tecnologia e Operações com passagens por Embratel, Sky e Globo, pontua que, mais do que uma oportunidade de exposição de produtos, serviços e ideias, as grandes feiras são ambientes de troca de experiências e de criação de relações comerciais. 

“O virtual ajuda, mas não substitui. A indústria audiovisual, como tantas outras, precisa da volta de seus eventos, que ajudam você a descobrir aquela solução que não sabia que existia, para conhecer um novo colega que tem o mesmo desafio que o seu, mas é de outro continente, ou reforçar um laço de amizade de projetos bem sucedidos no passado que você gostaria de repetir.”

“De uma forma geral, o mercado tem experimentado altas audiências e resultados financeiros não tão alinhados com essa audiência [nos últimos dois anos]. Disso não podemos culpar a pandemia. É um processo em marcha que já vem acontecendo com diversas causas que não cabe aqui elencar. É claro que no ápice da pandemia tivemos um breve apagão de produções autorais com script, mas como esta é uma indústria nascida da tecnologia eletrônica, vimos o quão rápido ela se adaptou com produções remotas, eventos ao vivo pela internet e chegou aos lares pelos diversos meios eletrônicos existentes”, complementa.

Evolução e possível fim das grandes feiras

Daniel Lahtermaher
(K2 Consultoria)

O “papel” das grandes feiras vem evoluindo ao longo dos tempos, na opinião de Daniel Lahtermaher, da K2 Consultoria. “Em um passado que já vai ficando longínquo, [elas] constituíam uma grande fonte de informação. A conveniência dos consumidores de encontrar em um só local tudo o que o mercado tinha a oferecer casava muito bem com a importância para os fornecedores de poder falar com um grande número de interessados de uma só vez e aproveitar a ocasião para trazer suas novidades e lançamentos. Com o desenvolvimento de novos canais de comunicação cliente-fornecedor, esta vantagem básica foi perdendo relevância.” 

“A internet é quase uma feira permanente com sites no lugar de estandes. Além disso, o software, que vem ganhando importância em relação ao hardware, pode ser degustado de outras formas, que prescindem das feiras. Mas as grandes feiras tem outros atrativos mais subjetivos, permitem algum networking, ajudam a fortalecer uma sensação de pertencimento, podem constituir uma premiação para alguns executivos bancados por suas empresas em uma viagem agradável, etc. São também uma festa do setor”, lembra.

O consultor, entretanto, faz uma provocação. “As feiras são no fundo mais uma mídia e, como toda a mídia, estão sofrendo ataques de novas formas de comunicação. Cancelamentos são fruto das dificuldades causadas pela pandemia, mas também refletem a empolgação da audiência e dos anunciantes com esta mídia que já vai envelhecendo. Não fosse falta de empolgação, alternativas seriam construídas. Dois cancelamentos seguidos levantam a preocupação sobre a próxima edição. Os anunciantes vão achar seu caminho. Reforçar a presença online, com mais e melhor informação e conteúdo disponível em sites, mídias digitais e mídias sociais, reforçar seu networking com eventos privados e/ou participação em eventos menores online e offline, reforçar as formas de promover o contato com seus produtos, através de trials e ofertas freemium.”


Fotos: Divulgação NAB Show / Arquivo pessoal executivos

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