Marcelo Bechara, executivo do Grupo Globo descreve o impacto das perdas com a pirataria na sociedade.

As operações policiais cada vez mais eficientes e a importante mudança de postura dos órgãos de Estado no enfrentamento da pirataria, elevou significativamente o tratamento diante da gravidade do tema nos últimos anos.

A colaboração contínua da indústria de mídia, junto ao maior alinhamento dos órgãos reguladores, polícias e outros agentes de governo, têm gerado resultados significativos no combate a esta prática.

A  própria expressão “pirataria” não ajuda. Afinal, apesar de ladrões dos mares, os piratas carregam um certo charme e estilo à La Jack Sparrow, como nas obras de ficção, com um quê romântico e fantasioso de indivíduos à margem da sociedade que encontram nessa prática o seu sustento. Contudo, o inimigo agora é outro. E o sistema é complicado, parceiro.

A sociedade sabe

 Sejamos sinceros: a sociedade é extremante flexível com essa prática delituosa. O ato é consciente e intencional. O mesmo cidadão capaz de se ultrajar com condutas como a corrupção, por exemplo, não se incomoda em assistir ao canal de notícias através de caixinhas ilegais.

Acontece que, até pouco tempo, a pirataria do audiovisual era um problema da indústria. Eu, cidadão de bem, adoro futebol e não acho que assistir jogos de canais pay-per-view de graça tornará o mundo pior, tampouco vai prejudicar meu time do coração. Ledo engano.

O atual estado da arte da pirataria pelas famosas caixinhas conectadas em redes domésticas é um problemão instalado nas salas de milhões de brasileiros.

Em recente decisão, a Anatel entendeu que a colocação de terminais não homologados fere as regras de comercialização de equipamentos de telecomunicações no país. Inclusive, alguns dos maiores marketplaces já estão atuantes e vigilantes para barrar a venda dessas caixinhas.

Precisamos agora de um novo passo. Anatel e Ancine, agências reguladoras do setor de telecomunicações e do mercado audiovisual brasileiro, respectivamente devem, juntas, estabelecer regulamento próprio para que detentores de direitos autorais possam reclamar e promover a suspensão de Ips, DNS e URLs que afrontem às leis.

Como está lá fora

Portugal é um exemplo de como tal medida foi benéfica e transformadora. Mais recentemente, a Indonésia seguiu caminho semelhante, e já inverteu a curva de consumo de conteúdos lícitos e ilícitos por meio da pirataria.

Em janeiro de 2013, as empresas provedoras de conexão fecharam a chamada porta 25 – a entrada padrão da troca de e-mails para a abertura da porta 587, considerada a mais segura. Tudo isso, por causa dos spams, as famosas mensagens indesejadas que, via de regra, têm conteúdo de caráter comercial, mas podem trazer consigo arquivos maliciosos e a prática do phishing scam.

A importância dessa medida – extremamente correta na minha opinião – mereceu uma previsão regulamentar de exceção na quebra da neutralidade da rede. A gestão na porta 25, nada mais é do que um bloqueio que atua diretamente na rede. Assim, o Brasil deixou de ser um dos maiores “spammers” do mundo, e se tornou um lugar seguro – com máquinas zumbis – para a atuação de agentes mal-intencionados.

Precisamos fazer gestões permanentes nas redes de telecom de modo a bloquear o IP de caixas e sites que se dediquem a disponibilizar conteúdos ilegais.

Aos que advogam contra, pois entendem que, para derrubada de conteúdos piratas na rede é preciso ordem judicial, saibam que as mensagens indesejadas também são conteúdo. Ambas têm questões intrínsecas de segurança cibernética. É fato que, assistir o jogo do meu time é mais proveitoso que receber spams na caixa de entrada. Mas, nossa tradicional flexibilidade diante da pirataria precisa mudar.

Pirataria caseira

O DVD pirata queimado industrialmente em local desconhecido era apenas um conteúdo em mídia física isolada. Agora, a indústria ilegal digital passa a ser nos lares. Cada caixa conectada é um elemento da rede descentralizada ilegal que opera de forma permanente.

O problema não é apenas mais meu, como indústria. O problema está dentro da sua casa, com terminal conectado à rede como máquina zumbi de nova geração, se prestando ao armazenamento de fotos de pornografia infantil, mineração de criptomoedas e exposição dos dados pessoais de sua família. O problema é seu também!

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